quarta-feira, 24 de março de 2010

O mundo é um moinho

Ainda é cedo, amor. Mal começaste a conhecer a vida, já anuncias a hora de partida sem saber mesmo o rumo que irás tomar. Preste atenção, querida. Embora eu saiba que estás resolvida, em cada esquina cai um pouco a tua vida. Em pouco tempo não serás mais o que és.
Ouça-me bem, amor. Preste atenção, o mundo é um moinho; vai triturar teus sonhos, tão mesquinho. Vai reduzir as ilusões a pó.
Preste atenção, querida; de cada amor, tu herdarás só o cinismo. Quando notares estás à beira do abismo. Abismo que cavaste com os teus pés.

(CARTOLA. O mundo é um moinho, 1976)


terça-feira, 23 de março de 2010

Levê-me

Tem tanta gente querendo morrer. Tem tanta gente que morre querendo viver. Puta sacanagem. Noites em claro, pesadelos quase menos piores que a vida "real". Escape, sonho não se controla. Ou sim, mas eu não consigo. Não é esse o ponto. O que me consola é lembrar das minhas agonias, nesse mesmo lugar, e dizer-me: ainda bem que não morri. Passada a ressaca, a vida me trouxe gratas surpresas que eu não teria vivido se minha vontade tivesse sido realizada.

Felicidade dói. Dói porque não é uma constante. Não é como ser um metro e quase sessenta, que, com mais alguns centímetros será a medida do meu caixão. É um estado, é coisa que passa.

O tesouro não deveria vir pela batalha. Quando é difícil, a gente valoriza, a gente se apega. Eis aí a pá com a qual cavamos nossa cova: te apega, só pra ver. Passa. Acaba. É finito.

A fumaça subindo na minha cara me deu a sensatez de pedir exatamente aquilo que preciso. Simples, sem drama. Quero o remanso de CB para dizer serena e convictamente algo que não poderia fazer mais sentido: passou este verão, outros passarão, eu passo.